19 de dez. de 2010

Desabafo : Interpretação de texto é a coisa mais SACAL num concurso público

Interpretação de texto é a coisa mais SACAL num concurso público

Uma pequena e rápida mudança  de foco neste blog!

Pessoal, eu ando indignado com quem elabora a parte de interpretação de texto de concursos públicos.
Como não sei quem são nem quantos são, meu ódio dilui-se ( ou talvez amplie-se ) e eu fico mais p* ainda.



Certo que muitas pessoas sabem ler e escrever, mas muitas vezes não entendem o que se apresenta a sua frente.
Mas muitos que elaboram as questões de interpretação de texto - pasmem - também não compreendem o que leêm.

Não raro vemos questões que juramos ter acertado, mas inacreditavelmente constatamos que erramos - tudo porque não soubemos captar a mente parva e a ótica distorcida desses diletos imbecis.
Tudo porque presume-se que ELES sabem interpretar a porcaria do texto que irão nos apresentar.

Um exemplo clássico deu-se com o escritor e teledramaturgo Mario Prata.
Um texto dele foi escolhido para uma prova de vestibular e  um amigo mandou para ele as questões relativas ao texto escolhido.
Por curiosidade ele respondeu às questões e ao conferir no gabarito ele não pôde conter seu espanto - TODAS erradas.
No programa do Jô ele desceu o pau em cima disso, ou seja, quem redigiu as questões interpretou de acordo com sua lógica e compreensão e não de acordo com o que o texto do Mario queria dizer ( ou não quis dizer nada, já que isso pode ser muito relativo ).

Fiz o concurso do IBGE (2009), e colocaram logo de cara um texto de Cláudio de Moura Castro ( " Da arte brasileira de ler o que não está escrito " - excelente, diga-se de passagem ),colunista da revista Veja, e que por uma interessante coincidência tratava justo desta questão - de se compreender (ou não) o que está escrito, da lógica principal que o autor quis passar e não das 'entrelinhas' do texto, que nem existem em textos, digamos, objetivos.
Pois quem redigiu a parte de interpretação dessa prova foi pego justamente no laço do autor - também não entendeu o 'espírito' da coisa.
Fiquei fulo porque questões estavam 'na cara', ainda assim , foram consideradas certas as alternativas que menos tinham a ver com o texto.
Que saco isso!!!

Portanto, nobre amigo(a) leitor, quando for fazer um concurso público, respire fundo - nunca se sabe qual o imbecil que foi escolhido para a parte de interpretação de texto (e que se arroga ainda na qualidade de 'professor), e você pode ser pego pela mente tresloucada dele(a) - afinal, nunca se sabe o que ele ou ela bebeu, fumou ou cheirou para poder viajar pelas idéias inexistentes do texto que vos será apresentado...

Como bem frisou Claúdio de Moura:
"Sua imaginação criativa não se detém sobre a aborrecida lógica do texto. É a vitória da semiótica sobre a semântica."


Grande abraço indignado.


P.S. - E para quem quiser conferir o texto magistral de Cláudio de Moura Castro, aí vai o texto completo:



Boa leitura ( e faça o favor de entender corretamente a 'ótica' do autor =D ) hehehehe


Da arte brasileira de ler o que não está escrito

Cláudio de Moura e Castro

                Terminando os poucos anos de escola oferecidos em seu vilarejo nas montanhas do Líbano, o jovem Wadi Haddad foi mandado para Beirute para continuar sua educação. Ao vê-lo ausente de casa por um par de anos, a vizinha aproximou-se cautelosa de sua mãe, jurou sua amizade à família e perguntou se havia algum problema com o rapaz. Se todos os coleguinhas aprenderam a ler, por que ele continuava na escola? Anos depois, Wadi organizou a famosa Conferência de Jontiem, “Educação para todos”, mas isso é outro assunto.
                Para a vizinha libanesa, há os que sabem ler e há os que não sabem. Não lhe ocorre que há níveis diferentes de compreensão. Mas infelizmente temos todos o vício de subestimar as dificuldades na arte de ler, ou, melhor, na arte de entender o que foi lido. Saiu da escola, sabe ler.
                O ensaio de hoje é sobre cartas que recebi dos leitores de VEJA, algumas generosas, outras iradas. Não tento debater críticas,  pois minhas farpas atingem também cartas elogiosas. Falo da arte da leitura.
                É preocupante ver a liberdade com que alguns leitores interpretam os textos. Muitos se rebelam com o que eu não disse (jamais defendi o sistema de saúde americano). Outros comentam opiniões que não expressei e nem tenho (não sou contra a universidade pública ou a pesquisa).
                Há os que adivinham as entrelinhas, ignorando as linhas. Indignam-se com o que acham que eu quis dizer, e não com o que eu disse. Alguns decretam que o autor é horrendo neoliberal e decidem que ele pensa assim ou assado sobre o assunto, mesmo que o texto diga o contrário.
                Não generalizo sobre as epístolas recebidas – algumas de lógica modelar. Tampouco é errado ou condenável passar a ilações sobre o autor ou sobre as consequências do que está dizendo. Mas nada disso pode passar por cima do que está escrito e da sua lógica. Meus ensaios têm colimado assuntos candentes e controvertidos. Sem uma correta participação da opinião pública educada, dificilmente nos encaminharemos para uma solução. Mas a discussão só avança se a lógica não for afogada pela indignação.
                Vale a pena ilustrar esse tipo de leitura com os comentários a um ensaio sobre nosso sistema de saúde (abril de 1997). A essência do ensaio era a inviabilidade econômica e fiscal do sistema preconizado pela Constituição. Lantejoulas e meandros à parte, o ensaio afirmava que a operação de um sistema da saúde gratuito, integral e universal consumiria uma fração do PIB que, de tão alta (até 40%), seria de implantação inverossímil.
                Ninguém é obrigado a aceitar essa afirmativa. Mas a lógica impõe quais são as possibilidades de discordar. Para destruir os argumentos, ou se mostra que é viável gastar 40% do PIB com saúde ou é necessário demonstrar que as contas que fiz com André Medici estão erradas números equivocados, erros de conta, hipóteses falsas, há muitas fontes possíveis de erro. Mas a lógica do ensaio faz com que só se possa rebatê-lo nos seus próprios termos, isto é, nas contas.
                Curiosamente, grande parte das cartas recebidas passou por cima desse imperativo lógico. Fui xingado de malvado e desalmado por uns. Outros fuzilaram o que inferem ser minha ideologia. Os que gostaram crucificaram as autoridades por negar aos necessitados acesso à saúde (igualmente equivocados, pois o ensaio critica as regras e não as inevitáveis consequências de sua aplicação).
                Meus comentaristas escrevem corretamente, não pecam contra a ortografia, as crases comparecem assiduamente e a sintaxe não é imolada. Contudo, alguns não sabem ler. Sua imaginação criativa não se detém sobre a lógica aborrecida do texto. É a vitória da semiótica sobre a semântica.


Betto Coutinho

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